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O estágio de convivência na adoção internacional

O ESTÁGIO DE CONVIVÊNCIA NA ADOÇÃO INTERNACIONAL
Por Hugo de Figueiredo Moutinho





A adoção internacional, nos dias de hoje, vem ganhando grande importância no terreno jurídico nacional, havendo grandes debates entre os juristas nacionais.
De um lado temos aqueles que defendem a sua abolição do sistema jurídico brasileiro, ao argumento de que a adoção realizada por estrangeiros pode contribuir para o tráfico de menores, além de dificultar o trabalho de acompanhamento realizado pelas autoridades brasileiras. Afora isso, alegam, ainda, que a adoção internacional estaria ferindo o direito à identidade da criança, uma vez que a mesma deixa o seu Estado e passa a viver em território alienígena, e, na maioria dos casos, acabava perdendo completamente o vínculo com seu Estado natal.
Tais argumentos, imbuídos de um sentimento de xenofobia, não convencem. Como fica o direito da criança a ter uma família, a poder chamar um homem de pai e uma mulher de mãe? Será que o amor (o sentimento mais nobre que existe) pode sofrer barreiras unicamente porque existe alguns riscos na adoção internacional? Na verdade, visando evitar futuros problemas para os menores é que nosso legislador, no art. 46, § 2º, do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) previu a figura do estágio de convivência, o qual é obrigatório nos casos de adoção internacional e deve ser cumprido integralmente no Brasil.
Antes de adentramos no tema central deste artigo, iremos tratar um pouco da adoção internacional propriamente dita, fixando alguns conceitos que nos ajudaram a entender melhor o motivo da existência do estágio de convivência.
1. Breves comentários sobre a adoção internacional
Embora todas as pessoas tenham uma família natural, existem várias motivos para que algumas pessoas não estejam desfrutando deste convívio familiar, quer porque os pais faleceram, quer porque foi dado para adoção, uma vez que os pais não possuíam condições de criar a criança, além de outras causas. O fato é que em muitos casos há a necessidade de se colocar os menores em uma família substituta. E tal intento pode ser alcançado através de algumas formas.
Uma dessas formas é através da adoção. A adoção, segundo o saudoso mestre Caio Mário da Silva Pereira:

“... é, pois, o ato jurídico pelo qual uma pessoa recebe outra como filho, independentemente de existir entre elas qualquer relação de parentesco consangüíneo ou afim” (Instituições de Direito Civil, vol. V, 14.ed., Forense, 2004).

É através da adoção que uma pessoa é posta em uma família substituta na qualidade de filho, passando a possuir todos os direitos e deveres que um filho natural tem. É por meio da adoção que se faz a melhor forma de colocação de uma pessoa em uma família substituta.
A princípio apenas os brasileiros poderiam adotar. Entretanto, o Estatuto da Criança e Adolescente prevê a possibilidade da adoção ser feita por estrangeiros residentes e domiciliados fora do país.
A adoção internacional, portanto, é a o ato jurídico através do qual uma pessoa é inserida dentro de uma família substituta cujos adotantes são estrangeiros residentes ou domiciliados fora do país.
Falamos anteriormente das críticas que parte da doutrina faz a esse tipo de adoção. Entretanto, o que deve prevalecer é o princípio do melhor interesse da criança, insculpido nos arts. 43 do ECA e 1.625 do Código Civil de 2002. Não se pode permitir que alguns mal-intencionados consigam impedir as adoções realizadas com o objetivo de realmente amparar os menores.
E exatamente para verificar quais são as reais intenções dos adotantes estrangeiros é que existe a figura do estágio de convivência.
2. O estágio de convivência na adoção internacional
Estabelece o § 2º do art. 46 do Estatuto da Criança e do Adolescente:

“Art. 46. ...
...

§ 2º Em caso de adoção por estrangeiro residente ou domiciliado fora do País, o estágio de convivência, cumprido no território nacional, será de no mínimo quinze dias para crianças de até dois anos de idade, e de no mínimo trinta dias quando se tratar de adotando acima de dois anos de idade”.

O estágio de convivência é obrigatório, e deve ser cumprido no Brasil com o intuito não só de adaptação dos adotantes para com o adotado, mas, também, para pesquisar e analisar quais são as reais intenções dos adotantes, uma vez que podem ter objetivos escusos em relação aos menores.
O prazo do estágio de convivência será no mínimo o de quinze (15) dias para crianças de até dois anos de idade e de trinta (30) dias quando o adotando possuir idade acima dos dois anos. Percebe-se, nitidamente, pela redação do dispositivo citado, que esses limites são mínimos, ou seja, não pode o magistrado conceder prazos menores. Entretanto, por serem mínimos os prazos, isso significa que o magistrado, verificando no caso concreto, a necessidade de aumentar tal prazo, pode e deve fazê-lo.
Em qualquer relação que envolva menores o princípio do melhor interesse deve sempre nortear toda e qualquer decisão do magistrado, uma vez que os menores, de um modo geral, têm pouco ou nenhuma capacidade de se defenderem sozinhos dos abusos que possam estar sofrendo ou virem a sofrer.
Como dito anteriormente, o estágio de convivência não tem como único objetivo a verificação da adaptação dos menores com os futuros pais, mas, também, possui a finalidade de certificar quais realmente são as intenções dos adotantes, haja vista a possibilidade da existência dos fins escusos, como, por exemplo, o tráfico de crianças.
Exatamente por isso que o estágio de convivência não pode ser suprimido do processo de adoção internacional, pois, aqui os riscos são maiores.
Embora existam autores advogando a inconstitucionalidade do §2º, do art. 46 do ECA, não compartilhamos de tal entendimento. A tese de que feriria o art. 5º da Constituição Federal porque estaria dando tratamento diferenciado a estrangeiros e nacionais, uma vez que em relação a estes pode até ocorrer a dispensa do estágio quando a criança não possuir mais de um ano de idade, na verdade não convence.
Isso porque o princípio da igualdade previsto no art. 5º, caput, da Constituição Federal de 1988, tem a interpretação de se tratar às situações iguais da mesma forma e as desiguais de forma diferente. Por exemplo, é patente que os consumidores são mais frágeis nas relações de consumo, de modo que o Código de Defesa do Consumidor prevê a figura da inversão do ônus da prova, uma vez que a empresa que produziu o produto tem muito mais condições de realizar uma avaliação técnica sobre o mesmo que o consumidor, que desconhece os materiais e técnicas utilizadas em sua confecção.
Da mesma forma, é patente a diferença entre os estrangeiros e os nacionais, uma vez que estes permanecerão em território nacional, dando mais possibilidades das autoridades brasileiras de acompanhar o desenvolvimento dos menores, do que aqueles, que retornaram ao seu país de origem após a conclusão do estágio de convivência, sendo mais difícil para as autoridades brasileiras fazerem o trabalho de acompanhamento. As situações são completamente diferentes, de modo deve a lei tratar de forma diversa tais situações.
Desta forma, verificamos que o estágio de convivência na adoção internacional cumpre perfeitamente o seu papel, sendo de grande importância para essa modalidade de adoção.





Vitória/ES, 01 de novembro de 2007.


Hugo de Figueiredo Moutinho
Advogado
Bacharel em Direito pela Faculdade de Direito de Campos/RJ.

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